Onde Aterra o Aeroporto? Narrativa acerca da Incerteza Locativa do Novo Aeroporto de Lisboa
DOI:
https://doi.org/10.59072/rper.vi37.426Resumo
É consensual a ideia de que um aeroporto pode ser um instrumento para o desenvolvimento à escala nacional e regional, ao mesmo tempo que traz repercussões significativas ao nível local. É igualmente verdade que se trata de um enorme investimento e que o envolve uma enorme complexidade projetual. O caso concreto do novo Aeroporto de Lisboa (NAL) é um bom exemplo para comprovar mais uma vez estes pressupostos, mas também pode ser considerado como paradigma de um modo particular de pensar o território. Assim, o NAL deve ser visto como uma infraestrutura pesada e um processo complexo na sua caracterização mas também nas ondas de choque que gera no território. Contudo, a estas observações óbvias deve acrescentar-se um outro conjunto de questões bem menos referidas de caráter técnico mas também político, acabando por ser as que perturbavam (e perturbam) mais o processo. As questões políticas relacionam-se com as assimetrias do investimento público entre o Norte e o Sul do País, reforçando, no entender dos atores sociais e económicos do Norte, as injustiças distributivas já existentes. Não se trata apenas dos montantes envolvidos, mas também dos custos de oportunidade associados, já que na base da discussão está o grau de prioridade conferido a este projeto. Do lado das questões técnicas, desde o início que nunca ficou claramente comprovada a necessidade do aeroporto; nunca foram unânimes as implantações selecionadas; nunca se consensualizou o tipo de aeroporto. Toda esta complexidade e esta tensão foram sendo retratadas das mais diversas formas nos media, através de notícias, reportagens, debates, análises e artigos de opinião. As relações complexas que este paper pretende descrever baseiam-se apenas na recolha e no tratamento do material jornalístico publicado entre 2007 e 2012, acessível no Google© News, e no seu posterior cruzamento com as várias tomadas de decisão política possíveis de identificar através das edições do Diário da República. O processo ainda não estancou, quer no aprofundamento da sua complexidade (a ANA foi privatizada, o NAL suspenso, desenvolveram-se estudos para concretizar a solução Portela+1, etc.), quer nas suas implicações nos territórios e nas comunidades (planos que são suspensos, revistos e voltam à forma inicial, medidas preventivas, acordos como o Programa de Ação para o Oeste e a Lezíria do Tejo 2008-2017 na ordem dos dois mil milhões, etc.) A pesquisa serviu para demonstrar que, mesmo para um investimento que envolve um enorme esforço financeiro e delicadas consequências no ordenamento do território, a deriva decisional é a regra, ficando o território, o desenvolvimento regional e até as questões técnicas secundarizados num processo que se esgrime essencialmente entre a opinião publicada e a (in)decisão política.